Biscoitos de polvilho à moda antiga: rusticidade, qualidade e quantidade - Territórios Gastronômicos

Biscoitos de polvilho à moda antiga: rusticidade, qualidade e quantidade

Conheça um pouco da história da Mestra Maria do Beijo e aprenda uma receita bem fácil e muito gostosa.

Conheça um pouco da história da Mestra Maria do Beijo e aprenda uma receita bem fácil e muito gostosa.

Os inesquecíveis biscoitos de polvilho da Mestra Maria do Beijo

Por: Eduardo Avelar*

O Territórios Gastronômicos homenageia hoje uma personagem que marcou a nossa história de pesquisas e garimpos pelas cozinhas de Minas Gerais. Lá se vão mais de dez anos que conheci uma das mais lindas e importantes Mestras dos quintais de Minas Gerais.

Dona Maria Henriques ou Mestra Maria do Beijo, uma simpática, alegre e disputada avó por centenas de crianças, alunas das escolas da comunidade vizinha de sua casa no município de Igarapé que, quase todas as sextas feiras iam visitá-la para ouvir histórias e comer biscoitos , é claro!

Vitalidade de causar inveja

A vitalidade de Dona Maria começava pelo plantio e colheita de vários pés de mandioca que ela cultivava no fundo de seu imenso quintal, cheio de outras plantas, hortaliças, galinhas, ervinhas, frutas e tudo mais que compõe esse cenário de sonhos e lembranças da infância de todos nós.

Segundo ela, na plenitude de sua simplicidade, ” plantava, colhia, “relava”(ralava), “trucia” (torcia) e fazia polvilho e farinha”. Era emocionante vê-la em atividade, com a enxada e o facão na mão, depois no ralador manual, que algum tempo depois foi substituído pelos filhos por um elétrico mas não menos rústico, para a seguir ” trocer” na mão, tirar o polvilho para os biscoitos e a massa para fazer a farinha, naquele imenso tacho na fornalha a lenha. Mas não sem antes secar esta massa num varal improvisado no meio do pátio do quintal.

Sabedoria e alegria

Chego a me emocionar ao lembrar as cenas e as nossas conversas, sempre alegres e cheias de ensinamentos, de técnicas mas principalmente de vida. A alegria da Mestra ao mexer a farinha naquele imenso tacho entre a espessa fumaça, com um sorriso permanente de quem estava numa outra dimensão, no paraíso, não sai de minha lembrança, assim como o preparo do biscoito na gamela de madeira pelas mãos marcadas pelo tempo mas ágeis e firmes, que depois espremiam aquele saquinho surrado, sempre ritmados fazendo desenhos nos tabuleiros pretos e untados que logo seguiam para o forno quente.

Quantidade e qualidade

Somente um tempo depois, após uma sequência de visitas e criando uma amizade maravilhosa, entendi toda aquela quantidade, que se destinava às latas, pacotes sacos e vidros que eram estocados num cômodo daquela pequena e muito bem organizada casa, que eram destinados à comercialização na idade. E o cômodo ficava lotado de farinhas, polvilhos e biscoitos, além de outras guloseimas que faziam parte das variações dos temas daquele quintal como biscoitos diferentes e docinhos.

Mas ainda assim, custei a descobrir o motivo do exagero na produção das sextas feiras, mistério que logo foi desfeito pela algazarra causada pela chegada de cerca de 40 crianças uniformizadas trazidas pela filha de Doma Maria, uma professora que premiava os seus alunos ao final das aulas da semana pelo bom comportamento levando-os para visitar a vovó Maria do Beijo, ouvir suas histórias e comer biscoitos até não poder mais…

Poderia ficar aqui escrevendo mais diversas histórias e lembranças dessa grande mestra de nossas cozinhas, mas vamos àquela receita que deixou saudades, é bem fácil de fazer e maravilhosa de comer.

Experimente os biscoitos da Mestra Mari do Beijo, diretamente dos famosos Quintais de Igarapé, garimpadas pelo Projeto Sabores de Minas.

Receita

Biscoito de polvilho da Mestra Maria do Beijo

Da Série: Quintais e Quitandas de Minas Gerais*

Ingredientes:

– 2,5 kg de polvilho doce

– 1 litro de óleo, mais o suficiente para untar

– 500 ml de água

– Sal a gosto

– 4 dúzias de ovos

Modo de Preparo:

Pôr o polvilho em uma gamela. Aquecer o óleo por aproximadamente seis minutos e despejar por cima do polvilho. Ferver a água e também despejar sobre a mistura. Mexer com uma colher de pau e, quando estiver morno, sovar bem, até esfriar. Pôr os ovos, um a um, e amassar até obter uma mistura homogênea, com a consistência mais mole. Pôr a massa em um saco de plástico ou de pano, com um corte em uma das pontas.

Espremer no tabuleiro, untado com óleo, fazendo meias-luas ou o formato que desejar e na espessura que o tabuleiro comportar. Assar em forno bem quente até o biscoito crescer e ficar dourado.

(foto: Jair Amaral/EM)

*Receita fornecida por Dona Maria Henriques Maia, a Mestra Maria do Beijo de Igarapé para o Projeto Sabores de Minas

Riqueza

Tema desta edição do Sabores de Minas, os quintais são destaque na cultura de Igarapé. Mesmo com todas as facilidades dos dias de hoje, moradores fazem questão de manter o costume de cultivar hortas, pomares e criar galinhas no fundo das casas. Inspire-se!

(foto: Jair Amaral/EM)
Dona Maria do Beijo em seu quintal. Uma alegria que contagia. (foto: Jair Amaral/EM)

Doce magia dos quintais

Saudações aos apreciadores da boa mesa! O Sabores de Minas prova que não é preciso ir tão longe de casa para se surpreender. Estamos em Igarapé, a 33 quilômetros de Belo Horizonte, lugar em que o cotidiano pacato e as tradições sobrevivem, mesmo com a proximidade de grandes centros urbanos. E para desvendar a riqueza da cidade, basta chamar ao portão, entrar pelas casas e conhecer os quintais de nossos anfitriões.

Nesse verdadeiro mundo de descobertas, a vontade é de descalçar os sapatos, pisar na terra, descansar à sombra de árvores, ouvir boa prosa e se deliciar com ingredientes colhidos na hora. A primeira a abrir as portas aos viajantes é Maria Henriques Maia, a Maria do Beijo. Em seu quintal predominam os pés de mandioca, mas também há espaço para feijão miúdo, ervas e verduras. Com a mandioca cultivada, Maria do Beijo prepara famosos biscoitos de polvilho, que fazem sucesso até em festas de casamento.

Aos 79 anos, é ela quem faz todo o trabalhoso processo: colhe a mandioca, rala, passa na peneira e deixa secar, até obter o polvilho. Para fazer a farinha torrada e o bolinho de feijão, ela também assume todas as etapas, desde o cultivo da matéria-prima ao preparo das iguarias. Acompanhar Maria do Beijo em sua lida diária faz bem a qualquer um. É por isso que ela deixa aberto o convite a quem quiser conhecer seu quintal, provar as iguarias e, é claro, bater um bom papo.

Mapa dos Territórios Gastronômicos de Minas Gerais: O município de Igarapé está localizado no Território Central/Entorno

EA/TG – CENTRAL/ENTORNO

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Portal UAI.

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